Caso Faroeste: MPF denuncia desembargadora do TJBA Ilona Reis e mais três pessoas por corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa

Denúncia oferecida pelo MPF ao STJ nesta quarta-feira (30/12/2020) é resultado de investigações realizadas na 6ª e 7ª fases do Caso Faroeste.
Denúncia oferecida pelo MPF ao STJ nesta quarta-feira (30/12/2020) é resultado de investigações realizadas na 6ª e 7ª fases do Caso Faroeste.

O Ministério Público Federal (MPF) ofereceu ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) mais uma denúncia no âmbito da Operação Faroeste. Desta vez, estão entre os denunciados a desembargadora do Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA) Ilona Marcia Reis, e os advogados Marcelo Junqueira Ayres Filho, Fabrício Bôer da Veiga e Júlio César Cavalcanti Ferreira. Eles são acusados da prática dos crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e de pertinência em organização criminosa. Segundo o apurado pelo MPF, os quatro pertenciam a um grupo criminoso cuja dinâmica era organizada em quatro núcleos: judicial, causídico, econômico e de defesa social. Este último foi criado depois, supostamente, para blindar os demais núcleos. Ilona Reis teve prisão temporária decretada em 14 de dezembro, e está presa preventivamente desde o dia 19 de dezembro de 2020, no âmbito da 6ª e 7ª fases da Operação Faroeste [1].

“Os elementos probatórios reunidos durante as investigações revelam que ao menos quatro pessoas se associaram, com estabilidade e permanência entre setembro de 2019 e dezembro de 2020, com o objetivo de obter vantagens, sobretudo econômicas, mediante a prática de crimes de corrupção e lavagem de dinheiro”, ressalta a denúncia do MPF, enviada nesta quarta-feira (30/12/2020) ao STJ, e assinada pela subprocuradora-geral da República Lindôra Araújo. Os valores envolvidos na trama objeto da denúncia são estimados em R$ 800 mil, com pagamentos da ordem de R$ 300 mil em dinheiro com o objetivo de não deixar pistas da vinculação criminosa entre os integrantes da orcrim.

De acordo com a denúncia, a organização criminosa montada pela desembargadora Ilona Reis, segundo relato e provas apresentadas por um colaborador, teve os advogados Marcelo Junqueira e Fabrício Bôer como principais operadores, cabendo ao colaborador pagar e confeccionar as decisões, dentro dos parâmetros ilícitos acordados entre os integrantes do grupo. Segundo o MPF, todos estavam ajustados para atuar em um organismo criminoso, e dispostos a fazer circular divisas ilícitas entre eles.

“Em linhas gerais, a desembargadora Ilona Reis teve atuação central na organização criminosa em questão, exercendo o comando do grupo. Não obstante, a subsistência do grupo criminoso dependia da articulação e operacionalização dos ilícitos, a qual se dava, majoritariamente, pelo intermediador Júlio César”, diz um dos trechos da denúncia.

O advogado Marcelo Junqueira tornou-se o operador da magistrada, agindo sob as ordens e atendendo os interesses dela. Foi apurado que ele negociava diretamente as decisões judiciais e atuava na operacionalização do recebimento dos valores em espécie pelo grupo criminoso, e que mantinha interlocução com Júlio César e Ilona Reis. Júlio era o responsável por redigir decisões judiciais, assinadas por Ilona, para beneficiar outro braço da organização criminosa que agia no Oeste baiano, liderado por Adailton Maturino.

Além de operador da orcrim, Fabrício Bôer teve atuação decisiva na negociação de pronunciamento judicial e na entrega de propinas a Júlio César. “As investigações foram suficientes para estabelecer um contexto probatório que aponta que a organização criminosa capitaneada pela desembargadora Ilona Reis foi uma das vias de disseminação de corrupção por meio de venda de atos judiciais para legitimação de terras no Oeste baiano, numa dinâmica operacional que contou com atuações criminosas dos advogados Júlio César, Marcelo Junqueira e Fabrício Bôer”, afirma o MPF na denúncia. Segundo o órgão ministerial, a orcrim de Ilona atuou em pelo menos três processos judiciais.

Na denúncia, o MPF adverte que a intenção não é impor qualquer tipo de responsabilização objetiva à magistrada apenas por sua atuação “judicante em matéria complexa, mas apontar evidências de que o entendimento dela teve como elemento catalisador as cifras bilionárias que orbitam os conflitos fundiários do Oeste da Bahia e potenciais vantagens indevidas a serem captadas”.

A denúncia vincula à Ilona Reis a movimentação suspeita de R$ 1,496 milhão, pelo recebimento de R$ 24.061,64 do zelador Reinaldo Santana Bispo, que, pela função que exerce, não teria como dispor desse valor. O zelador recebeu R$ 1 mil da JJf Holding de Investimentos e da Geciane Maturino Eireli, empresas de lavagem de dinheiro utilizadas por Adailton Maturino.

Pedidos

Além do recebimento integral da denúncia, o MPF requer ao STJ que sejam decretados a perda da função pública dos denunciados e o perdimento do produto e proveito dos crimes, ou de seu equivalente, no valor mínimo de R$ 300 mil, correspondente à soma da lavagem no esquema apurado, que deverá ser atualizada com juros e correção monetária, de acordo com o previsto na Lei de Lavagem de Capitais.

Também pede que os denunciados sejam condenados ao pagamento de indenização por danos morais coletivos no valor de R$ 800 mil, acrescido de juros de mora e de correção monetária, correspondente ao montante de dinheiro veiculado na engenharia financeira operada pela orcrim, “pois os prejuízos decorrentes dos crimes de organização criminosa e lavagem são difusos e pluriofensivos, e deram causa, ilicitamente, ao descrédito do mais elevado órgão do Poder Judiciário local perante a sociedade”.

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Referência

[1] Em 14 de dezembro de 2020, foi deflagrada pela Polícia Federal (PF) a 6ª e 7ª fases da Operação Faroeste que objetivou apurar, em tese, a prática dos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro, numa dinâmica organizada, em que gravitam 4 núcleos de investigados: a) núcleo judicial, onde operam desembargadores, magistrados e servidores do Tribunal de Justiça da Bahia, b) núcleo causídico, que tem advogados fazendo a intermediação entre os julgadores e produtores rurais, c) núcleo econômico, que conta com produtores rurais, todos com a deliberada intenção de negociar decisões, em especial, para legitimação de terras no oeste da Bahia, não se perdendo de vista a descoberta posterior do d) núcleo de defesa social, cuja provável missão era dar blindagem aos demais núcleos, tendo, em sua composição a então Procuradora-Geral de Justiça do Ministério Público da Bahia (MPBA), Ediene Lousado; o secretário de Segurança Pública da Bahia (SSP Bahia), Maurício Barbosa e a chefe de gabinete da SSP Bahia Gabriela Macedo, com financiamento do empresário José Marcos de Moura.

Em virtude da complexidade do esquema criminoso, o MPF segregou as apurações e ofereceu três denúncias autônomas com o objetivo de delimitar os fatos e individualizar as condutas de cada investigado no Inquérito 1.258/DF. As denúncias deram origem às ações penais 940, 953 e 965, que tramitam no Superior Tribunal de Justiça (STJ), com relatoria do ministro Og Fernandes.

Nos autos da decisão da medida Cautelar Inominada Criminal de n° 26 DF (2020/0097852-0), o ministro do STJ Og Fernandes destaca que na homologação do acordo de colaboração premiada com Júlio César (e-STJ fls. 95-104 e 136-143 da Pet n° 13.321/DF) foi determinada a remessa dos 25 anexos da delação premiada para aprofundamento das investigações sobre a “compra” de 30 sentenças judiciais, ocorrendo a distribuição da seguinte forma: (I) 11 anexos remetidos para livre distribuição aos ministros que compõem a Corte Especial do STJ; (II) 11 anexos distribuídos para esta Relatoria, em razão da prevenção; (III) 2 anexos remetidos ao TJBA; e (IV) 1 anexo remetido ao primeiro grau da Justiça Estadual da Bahia.

Delator do Caso Faroeste, o advogado, ex-servidor do TJBA Capo Júlio César Cavalcanti Ferreira (OAB Bahia nº 32.881) é réu em três Ações Penais que tramitam no STJ, as APn de nº 940 DF e 953 DF, a terceira não foi informado o número. Ele fez acordo de delação através do MPF, homologado pelo STJ, como membro de ORCRIM. O meliante é considerado como líder absoluto deste vasto império do crime desvelado com as investigações do Caso Faroeste, sendo responsável por corromper as estruturas do Poder Judiciário Estadual da Bahia (PJBA), com ramificações no Ministério Público da Bahia (MPBA) e no Poder Executivo Estadual.

*Com informações do Ministério Público Federal (MPF).

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Sobre Carlos Augusto, diretor do Jornal Grande Bahia 11043 artigos
Carlos Augusto é Mestre em Ciências Sociais, na área de concentração da cultura, desigualdades e desenvolvimento, através do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais (PPGCS), da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB); Bacharel em Comunicação Social com Habilitação em Jornalismo pela Faculdade de Ensino Superior da Cidade de Feira de Santana (FAESF/UNEF) e Ex-aluno Especial do Programa de Doutorado em Sociologia da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Atua como jornalista e cientista social, é filiado à Federação Internacional de Jornalistas (FIJ, Reg. Nº 14.405), Federação Nacional de Jornalistas (FENAJ, Reg. Nº 4.518) e a Associação Bahiana de Imprensa (ABI Bahia), dirige e edita o Jornal Grande Bahia (JGB), além de atuar como venerável mestre da Augusta e Respeitável Loja Simbólica Maçônica ∴ Cavaleiros de York.