Exclusivo: Juiz reverte decisão sobre retomada do Acordo Judicial de 2012 envolvendo terras da antiga Fazenda São José, confirma fraude e aplica multa de R$ 600 milhões contra casal Dias e Grupo Econômico dos Okamoto

Capítulo 133 do Caso Faroeste apresenta decisão, proclamada em 12 abril de 2023, pelo juiz Carlos Camillo, que reverteu retomada da homologação do Acordo Judicial de 2012 sobre as terras da antiga Fazenda São José.
Capítulo 133 do Caso Faroeste apresenta decisão, proclamada em 12 abril de 2023, pelo juiz Carlos Camillo, que reverteu retomada da homologação do Acordo Judicial de 2012 sobre as terras da antiga Fazenda São José.

Marilena Chaui — professora emérita de Filosofia Política e Estética da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (USP) — comenta sobre a classificação aristotélica para a consecução da Ciências Práticas, descrevendo, dentre outros, o conceito de Ética:

“A ação é realizada pela vontade guiada pela razão para alcançar o bem do indivíduo, sendo este bem as virtudes morais (coragem, generosidade, fidelidade, lealdade, clemência, prudência, amizade, justiça, modéstia, honradez, temperança, etc.)”. (CAHUÍ,2000, p. 49)

De forma brilhante e impulsionado pela ética e a moral, o magistrado encarregado por apreciar o conflito fundiário-jurídico sobre as terras da antiga Fazenda São José, em Formosa do Rio Preto, reverteu a própria decisão que tomou há cerca de 6 meses e afirmou aspectos fundamentais da demanda judicial que foram trazidos em reportagens do Jornal Grande Bahia (JGB), através da análise de jurista que acompanha o Caso Faroeste para o veículo de imprensa.

O que será relatado a seguir é inédito, atual e profundo porque revela, a partir do texto do próprio magistrado, a extensão do que certas pessoas e grupos econômicos são capazes, no intuito de manipular e tentar fraudar a própria Justiça, além do direito de terceiros.

O documento original da decisão proclamada está anexo à matéria e pode ser baixado. Ele foi enviado por fonte e será objeto de análises no domingo (16/04/2023) e nas semanas seguintes. Mas, por ora, é transcrita a essência da decisão proclamada.

A ética como valor na decisão do juiz Carlos Camillo, que reverte a homologação do Acordo Judicial entre Dias e Okamoto e estipula multa milionária

Em 7 de outubro de 2022, o juiz de Direito Substituto da 1ª Vara dos Feitos Relativos às Relações de Consumo, Cíveis, Comerciais de Formosa do Rio Preto, Carlos Eduardo da Silva Camillo, decidiu — sobre o Processo de Reintegração de Posse nº 0000157-61.1990.8.05.0081, interposto por José Valter Dias e a esposa Ildeni Goncalves Dias contra o Grupo Econômico dos Okamoto — retomar o Acordo Judicial celebrado entre as partes no ano de 2012.

Nesta quarta-feira (12/04/2023), de forma surpreendente e impulsionado por valores éticos imanentes à própria ideia de Justiça, o magistrado reverteu a decisão proferida em 7 de outubro de 2022 — sobre o Processo de Reintegração de Posse nº 0000157-61.1990.8.05.0081, interposto por José Valter Dias e a esposa Ildeni Goncalves Dias contra o Grupo Econômico dos Okamoto — cuja finalidade era retomar o Acordo Judicial celebrado entre as partes no ano de 2012.

Para além disso, o magistrado identificou tentativa de conduzir o próprio juízo à erro, fato que resultaria em fraudar a Justiça, além do direito de terceiros interessados na lide, que possuem de boa-fé e exploram parte das terras da antiga Fazenda São José, em Formosa do Rio Preto.

Indignado, o juiz determinou multa financeira contra os autores e réus da proposta de retomada do Acordo Judicial de 2012. O montante envolvido é de aproximadamente R$ 600 milhões e o valor será destinado para o fundo de segurança institucional do Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA).

A revisão do magistrado sobre a própria decisão ocorreu após a manifestação de terceiros interessados no processo, além de parecer emitido pelo Ministério Público da Bahia (MPBA).

A seguir, uma parte do resumo da Ação Judicial narrada pelo juiz Carlos Camillo

— As partes originárias no processo protocolaram novo acordo requerendo homologação judicial com a finalidade de pôr fim à lide, trazendo à baila alguns terceiros interessados, deixando de fora muitos agricultores que labutam na região há anos, fato que pode gerar uma grande insegurança jurídica e a volta das extorsões por parte do mecanismo envolvido na Operação Faroeste.

— Ocorre que o citado acordo expande indevidamente o objeto litigioso marcado na petição inicial e homologado judicialmente com sentença sob o manto da coisa julgada material e formal.

— Uma vez homologado o acordo e encerrada a etapa de conhecimento, nenhuma providência judicial de natureza executiva pode desdobrar dos parâmetros do título judicial.

— Nessa ordem de ideias, não se revela processualmente admissível qualquer medida judicial que busque implementar, à margem da transação homologada judicialmente, para ampliar o objeto da lide, ou seja, as partes pretendem aumentar o tamanho da área, anteriormente de 43 mil hectares, para 119.502,55 hectares.

— Vejamos que as partes tentam ampliar o objeto da lide em 76.502,55 hectares, em valores transforma-se em R$ 5.049.132.000,00 (cinco bilhões, quarenta e nove milhões, cento e trinta e dois mil reais), isso pelo valor venal da terra na região, em média 400 sacos de soja por hectare.

— Com isso, as partes violam frontalmente o art. 77, inciso VI do CPC, com a previsão de multa em seu parágrafo 2º.

— Vejam, a presente lide possui inúmeros terceiros interessados que irão buscar seus direitos em lides próprias e o presente acordo posto para homologação atenta contra à Justiça, já que inova de forma temerária tentando induzir o magistrado à erro, inclusive colocando tal avença em segredo de justiça sem fundamentação legal.

— Prevê o CPC como sanção para quem comete ato atentatório à dignidade da justiça uma sanção pecuniária (art. 76, § 2º), consistente em multa de até vinte por cento sobre o valor da causa (ou, sendo este irrisório, em até dez vezes o valor do salário-mínimo, nos termos do art. 76, § 5o), a ser fixada de acordo com a gravidade da conduta.

— Vemos que o valor do aumento substancial no objeto da lide envolve à casa dos bilhões de reais, maior que o PIB de muitos estados da federação. Diante disso, proporcional é aplicar o percentual de 10% sobre o valor da tentativa de inovação processual, ou seja, R$ 5.049.132.000,00 (cinco bilhões, quarenta e nove milhões, cento e trinta e dois mil reais).

— Fora essa inovação, as partes não demonstraram que possuem tais imóveis, já que diante das inúmeras petições de terceiros interessados, verifica-se que à posse dos imóveis é controversa, com isso, as partes estariam dispondo de bens que não os pertencem, vedado pelo ordenamento jurídico pátrio.

— Dessa forma, se o negócio jurídico tinha como motivo determinante a transferência de posse ou propriedade de bens que pertençam a terceiros que não estejam na relação contratual, vê-se que o motivo determinante, comum a ambas as partes, seja ilícito. O negócio jurídico é fruto da vontade das partes, que é resultado de um processo interno que a faz constituir os motivos da vontade, e este é o motivo determinante.

— Logo, se ambas as partes que celebram este negócio têm conhecimento acerca da real propriedade do bem, ambas manifestam a vontade de realizar um negócio jurídico que somente poderia ocorrer com a prática de um ato ilícito. No caso, a disposição de coisa alheia como própria, obtendo vantagem ilícita em prejuízo alheio.

— Ainda que o negócio jurídico seja revestido da forma prescrita em lei como tentativa das partes de legitimar o mesmo, se há o conhecimento das partes envolvidas que o bem era de propriedade de outrem, o motivo determinante, comum a ambas as partes, é ilícito. Seja bem móvel ou imóvel, a alienação de coisa alheia como própria à terceiro de má-fé acarreta nulidade do negócio.

A seguir, em 10 pontos, o que decidiu o juiz Carlos Camillo

— Pelo Exposto conheço dos Embargos de Declaração opostos, pois tempestivos, e no mérito acolho alguns Embargos e rejeitos os demais para:

1) Sanar o erro material que consta no item 02 da decisão Embargada e suprimo tal item do dispositivo, deixando de constar as matrículas oriundas da matrícula 1.037, canceladas pelo Conselho Nacional de Justiça.

2) Suprimo a omissão quanto a delimitação das áreas a serem reintegradas na posse, determinando que as partes tragam aos autos as delimitações das áreas pertencentes ao acordo firmado entre as partes e homologado judicialmente, que serão afirmadas em liquidação de sentença, nos exatos termos do tamanho da área determinada no acordo homologado judicialmente.

3) Reverto os mandados de reintegração de posse oriundos da decisão liminar, fls. 1.621/1.642, de 5 de abril de 2017, cancelada devendo os possuidores originários que foram retirados da posse por decisão nula, serem reintegrados e com isso reestabelecendo o status quo ante.

4) A área posta aos Autores da presente ação, 21.000ha (vinte um mil hectares) da área discutida, deverá ser especificada em liquidação de sentença, ficando proibida a sobreposição de área, bem como a sua colocação em área em que já há possuidores de boa-fé exercendo a agricultura.

5) Deixo de homologar o acordo tabulado entre as partes de ID 365770794, já que tal avença visa aumentar o objeto da demanda, sem, contudo, demonstrar a posse ou propriedade, caracterizando uma verdadeira inovação processual com a finalidade de induzir o juízo a erro, atentando contra o processo e o Poder Judiciário.

6) Condenar os autores e réus em litigância de má-fé, em 2% do valor atualizado da causa, ao tentarem induzir o Juízo ao erro inovando de forma ilegal no processo.

7) Condenar os autores e réus em ato atentatório à dignidade da Justiça, por tentarem aumentar o objeto da lide pela via transversa, após o trânsito em julgado, fato que iria prejudicar terceiros de boa-fé, revertendo esses valores para o fundo de segurança institucional do TJBA, já que autor e réu estão sendo condenados, na forma da Lei Estadual nº 13.971/2018, em seu § 4º, inciso IX, em percentual de 10% sobre o valor da tentativa de inovação processual, ou seja, R$ 5.049.132.000,00 (cinco bilhões, quarenta e nove milhões, cento e trinta e dois mil reais), a ser pago em 15 dias do trânsito em julgado da presente decisão.

8) Os demais embargos conheço, pois tempestivos e no mérito deixo de dar provimento, já que pretendem modificar a decisão embargada fazendo sucedâneo de recurso próprio, os Embargos Declaratórios são apelos de integração e não de substituição.

9) Terceiros interessados de boa-fé deverão buscar seus direitos em demandas próprias, não podendo peticionar sem fundamento e nexo causal com a origem dessa demanda sob pena de tumulto processual e litigância de má-fé, esclarecendo que a decisão posta não atinge direitos desses terceiros na forma do art. 506 do Num. 380612883 – Pág. 22 CPC.

10) Deixo de conhecer da petição de execução de honorários EMERSON ALLAN GONÇALVES OLIVEIRA a qual deverá ser posta e executada no processo de origem.

Baixe

Decisão do juiz Carlos Eduardo da Silva Camillo, proclamada em 12 de abril de 2023

Próximo capítulo

O Capítulo 134 (CXXXIV) do Caso Faroeste apresenta a 2ª Parte do Parecer emitido pelo promotor de Justiça Substituto Alysson Batista da Silva Flizikowski sobre a decisão proclamada em 7 de outubro de 2022 — pelo juiz de Direito Substituto da 1ª Vara dos Feitos Relativos às Relações de Consumo, Cíveis, Comerciais de Formosa do Rio Preto, Carlos Eduardo da Silva Camillo — referente ao Processo de Reintegração de Posse nº 0000157-61.1990.8.05.0081, interposto por José Valter Dias e a esposa Ildeni Goncalves Dias contra o Grupo Econômico dos Okamoto, que retomar o Acordo Judicial celebrado entre as partes no ano de 2012.

Será abordado, também, alguns aspectos da decisão proclamada, nesta quarta-feira (12/04/2023), pelo juiz Carlos Eduardo da Silva Camillo que reverteu a homologação do Acordo Judicial, em decisão firmada em 7 de outubro de 2022.


Referências

[1] CHAUI, Marilena. Convite à Filosofia. Ed. Ática, São Paulo, 2000.

O livro “Convite à Filosofia”, escrito pela renomada pesquisadora brasileira Marilena Chaui, é um marco no ensino da Filosofia no Brasil. Ele aborda de maneira acessível e contextualizada temas importantes da reflexão filosófica, levando o leitor a uma profunda compreensão dos grandes pensadores. A obra é um magnífico exercício do pensamento, que estimula a reflexão crítica e amplia os horizontes do leitor. Nela, são discutidos temas fundamentais da Filosofia, como razão, verdade, conhecimento, ciência, lógica, ética, política, arte, religião e metafísica, bem como questões relacionadas à cidadania, democracia, direitos humanos, novas tecnologias e ética.


Leia +

Capítulo 132 do Caso Faroeste: O que diz o parecer de abril de 2023 emitido pelo MPBA sobre a retomada de Acordo entre os Dias e os Okamoto envolvendo as terras da antiga Fazenda São José, em Formosa do Rio Preto; Parte 1

Capítulo 131 do Caso Faroeste: A parte 5 da decisão que, em tese, convalida fraude e titulariza 360 mil hectares de terras da antiga Fazenda São José, em Formosa do Rio Preto

Capítulo 130 do Caso Faroeste: A parte 4 da decisão que, em tese, convalida fraude e titulariza 360 mil hectares de terras da antiga Fazenda São José, em Formosa do Rio Preto

Capítulo 129 do Caso Faroeste: A parte 3 da decisão que, em tese, convalida fraude e titulariza 360 mil hectares de terras da antiga Fazenda São José, em Formosa do Rio Preto

Capítulo 128 do Caso Faroeste: A parte 2 da decisão que, em tese, convalida fraude e titulariza 360 mil hectares de terras da antiga Fazenda São José, em Formosa do Rio Preto

Capítulo 127 do Caso Faroeste: A parte 1 da decisão que, em tese, convalida fraude e titulariza 360 mil hectares de terras da antiga Fazenda São José, em Formosa do Rio Preto

Capítulo 126 do Caso Faroeste: A petição que pede fim do sigilo do processo envolvendo a disputas de terras da antiga Fazenda São José, em Formosa do Rio Preto

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Sobre Carlos Augusto, diretor do Jornal Grande Bahia 11043 artigos
Carlos Augusto é Mestre em Ciências Sociais, na área de concentração da cultura, desigualdades e desenvolvimento, através do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais (PPGCS), da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB); Bacharel em Comunicação Social com Habilitação em Jornalismo pela Faculdade de Ensino Superior da Cidade de Feira de Santana (FAESF/UNEF) e Ex-aluno Especial do Programa de Doutorado em Sociologia da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Atua como jornalista e cientista social, é filiado à Federação Internacional de Jornalistas (FIJ, Reg. Nº 14.405), Federação Nacional de Jornalistas (FENAJ, Reg. Nº 4.518) e a Associação Bahiana de Imprensa (ABI Bahia), dirige e edita o Jornal Grande Bahia (JGB), além de atuar como venerável mestre da Augusta e Respeitável Loja Simbólica Maçônica ∴ Cavaleiros de York.

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