Reportagem de Felipe Frazão e Camila Turtelli, publicada neste domingo (25/11/2018), no jornal O Estado de S. Paulo, revela atrito entre o presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) e lideranças partidárias do Congresso Nacional. Os líderes questionam nomeações que não possuem representatividade política e a formação de governo a partir das representações das Frentes Parlamentares Temáticas Pluripartidárias, a exemplo das bancadas do Boi, da Bala e da Bíblia (BBB).
Além do uso de nomeações com vínculos com as frentes parlamentares, Jair Bolsonaro pressiona governadores e prefeitos a apoiarem, através das bancadas estaduais com representação no Congresso Nacional, a pauta de reformas que será enviada em 2019. Em troca, ele promete reavaliar os financiamentos dos entes federativos junto à União e repactuação dos recursos financeiros arrecadados, com maior subdivisão entre os entes da Federação.
Críticas
Exemplo de contundente de crítica à Jair Bolsonaro partiu do PRB. O deputado federal Márcio Marinho (PRB/BA) afirmou que “Bolsonaro está montando um governo sem fazer interface com a política. Mas a gente sabe que isso aqui (Congresso) tem vida própria, nós representamos a todos no Congresso, são muitas demandas. Em determinado momento, acho que terá que ser repensado”.
O presidente nacional do PRB, Marcos Pereira, lamentou a consulta a Celso Russomanno (PRB/SP), cotado para uma pasta que reuniria Esporte, Turismo e Cultura, sem o conhecimento da legenda. Segundo a reportagem do Estadão, O presidente do PRB ficou irritado com a abordagem ao deputado e apresentador de TV e dirigentes o partido apostam que Bolsonaro pode oficializar o nome de Russomanno, que tem demonstrado proximidade com novatos do PSL.
Contando com três nomes no futuro Ministério do Governo, o Democratas sentiu o esvaziamento do partido, na medida em que os nomes não foram debatidos internamente pela legenda. O deputado federal Rodrigo Maia e ACM Neto, prefeito de Salvador e presidente do DEM, sentem o desprestígio político e observam o esvaziamento da liderança, com a assunção de Onyx Lorenzoni (DEM), membro do Governo de Transição de Bolsonaro e futuro ministro da Casa Civil.
A Câmara dos Deputados
O PSL elegeu a segunda maior bancada da próxima legislatura – 52 deputados. Somados aos partidos que aderiram a Bolsonaro no segundo turno ou demonstraram afinidade com ele, a base pode chegar a 191 – incluídos PTB, PSC, Patriota, PSD, DEM, PRB, Podemos, Novo e PRP. A oposição teria um tamanho inicial de 169 parlamentares.
Para ter mais de 308 votos, número necessário na Câmara para promover alterações constitucionais, o governo Bolsonaro dependerá dos partidos do Centrão e da centro-direita, entre eles MDB (34 deputados), PP (37), PR (34) e siglas nanicas, ameaçadas de perder parlamentares por não terem atingido a cláusula de desempenho eleitoral. Essas legendas não têm perfil de compor a oposição, mas podem complicar a governabilidade se ficarem ausentes da composição do governo. Apoiadores declarados de Bolsonaro no segundo turno, PTB, PSC e Patriota não estão, até agora, na formação do novo governo.
Governo sem coalizão
Existe séria dúvida sobre se a forma como o Governo Bolsonaro vai se relacionar com o Congresso Nacional produz consenso sobre matérias de interesse do Governo. A opção por abandonar o sistema de Governo de Coalizão com indicações pessoais e políticos sem vínculos com pautas sociais é uma forma do presidente eleito impor aos parlamentares a visão de Estado Neoliberal que ele representa. A possibilidade de êxito é mínima, porque a agenda neoliberal de extrema-direita reduz direitos sociais e amplia a concentração de riqueza, o que resultará em mais retrocesso social para um país marcado por secular e profunda desigualdade.
Observa-se que os parlamentares possuem maior conexão com as bases sociais, e os efeitos de medidas sociais restritivas a serem apresentadas pelo futuro governo devem ser objeto de amplo debate, mesmo entre os parlamentares que devem apoiar Jair Bolsonaro.
A ‘Trupe dos Chicago Boys de Bolsonaro’
A política neoliberal, baseada no Consenso de Washington e retomada pelo Governo Bolsonaro, após os governos petistas de Lula e Rousseff, é um projeto que foi testado no Brasil durante o Governo FHC, cujos efeitos práticos foi o elevado endividamento do Estado e da população, com incremento da concentração de renda, baixa qualidade dos serviços públicos e significativo retrocesso nos setores da Educação, Saúde, Trabalho e Habitação.
A ‘Trupe dos Chicagos Boys’, encastelada na Espalhada dos Ministérios, no futuro Governo Bolsonaro, discípulos de Milton Friedman (Nova Iorque, 31 de julho de 1912 — São Francisco, 16 de novembro de 2006) e leitora da obra autoral ‘Capitalismo e Liberdade’, entende bastante de rentismo, ou seja, de como concentrar a riqueza do país nas mãos de poucos. Essa política foi retomada pelo presidente Michel Temer, em 2016, ao assumir de forma antidemocrática a presidência da República e implantar a ‘Ponte para o Retrocesso’, conjunto de medidas que acelerou a desindustrialização, transferiu capital monopolista nacional para corporações internacionais, entregou riquezas nacionais, reduziu direitos sociais, reduziu o emprego formal, e ampliou o desemprego estrutural, o subemprego e a precarização, intensificando a desigualdade social. É neste descaminho que segue a ‘Trupe de Bolsonaro’.
Capitalismo e Liberdade
A obra mais conhecida de Milton Friedman, ‘Capitalismo e Liberdade’, foi publicada nos Estados Unidos em 1962. Na obra, adotando linguagem coloquial, o autor discorre sobre economia, e os subtemas liberdade econômica e liberdade política, o papel do governo numa sociedade livre, política fiscal, educação, monopólio, distribuição de renda, bem-estar social e combate à pobreza.
Teóricos acadêmicos identificam, na obra, a elaboração de uma ideologia sobre o Estado e a defesa do Capitalismo, com poucas afirmações com base empírica, ou seja, a maioria dos pressupostos teóricos adotados pelo autor não tem conexão com a materialidade, não possuem comprovação empírica.
Eles dizem, também, que no título da obra está a real revelação da ideologia defendida por Friedman, ou seja, que a única forma de liberdade existente no Capitalismo é a de que apenas os donos do Capital são livres. Conceito marxista, que é dissimulado na ideologia do teórico de extrema-direita da Universidade de Chico ao dissociar os temas Capitalismo e Liberdade e ao uni-los de forma ambivalente e não contraditória.
Para desmistificar a tese de Friedman, responda a si mesmo a seguintes perguntas:
Existe liberdade para os que não possuem Capital, no Capitalismo?
Em um sistema em que a riqueza é apropriada pelo processo de mais-valia, ou seja, de acumulação premente de capitais nas mãos de poucos, pode existir distribuição de riqueza sem a atuação do Estado?
No momento em que o liberalismo econômico atua com intensidade sem precedentes, através do processo tecnocrático antropocêntrico da globalização, como explicar a concentração de renda em economias centrais do Capitalismo, a exemplo dos Estados Unidos e Inglaterra e, a intensificação da Mudança Climática que atinge o planeta?
Talvez, os que questionarem possam encontrar respostas ao refletir sobre a ‘Alegoria da Caverna de Platão’, obra na qual o filosofo grego do Século IV a.C. relata as sombras nas quais os indivíduos acorrentados acreditam ser a realidade do mundo em que vivem.