Bembé do Mercado, festa que acontece em Santo Amaro, poderá se tornar Patrimônio Cultural do Brasil

Bembé do Mercado, festa que acontece em Santo Amaro, será apresentada pelo Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural, no dia 13 de junho.
Bembé do Mercado, festa que acontece em Santo Amaro, será apresentada pelo Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural, no dia 13 de junho.
Bembé do Mercado, festa que acontece em Santo Amaro, será apresentada pelo Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural, no dia 13 de junho.
Bembé do Mercado, festa que acontece em Santo Amaro, será apresentada pelo Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural, no dia 13 de junho.

“Sente-se o cheiro de lavanda, o frescor das folhas, o ritmo dos roçados das saias que, elegantemente, dançam para nos contar sobre aquele momento em que se ficou sabendo que a escravidão acabara e que era tempo de liberdade, aspirada com muito labor, por aqueles que por ela lutaram e que, certamente, não a usufruíram em sua plenitude. É pela rigorosa e bela entrega nos rituais que, ao mesmo tempo, se agradece e se luta em prol da necessária reivindicação de que, um dia, quem sabe, a abolição das desigualdades seja, realmente, consumada”.

Observar, sentir e compreender a celebração da liberdade. O convite à reflexão é feito pelo Dossiê de Registro do Bembé do Mercado, festa que acontece em Santo Amaro, e que será apresentada pelo Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural, no próximo 13 de junho. Os conselheiros, que estarão reunidos na sede do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), em Brasília, vão avaliar o parecer sobre a celebração afro-brasileira Bembé do Mercado, que teve início em 1889, um ano após a abolição da escravatura.

Assim, há 130 anos, todo dia 13 de maio é momento para rememorar a luta pela liberdade e a resistência dos povos negros, primeiro como escravizados, depois como cidadãos. Os praticantes dessa expressão cultural que tem forte base na religiosidade popular de matriz africana reforçam que a festa é um culto às divindades das Água representadas por Iemanjá e Oxum, sendo também momento de agradecer a proteção individual e coletiva.

O pedido para registrar a celebração foi apresentado ao Iphan pela Associação Beneficente e Cultural Ilê Axé Ojú Onirè no ano de 2014. O presidente da Associação, Jose Raimundo Lima Chaves, conhecido como Pai Pote, revela que a titulação como Patrimônio Cultural do Brasil será muito positiva, pois valorizará não só o povo de terreiro, como também a comunidade negra da diáspora africana. “Estou orgulhoso de ver o crescimento dessa celebração já reconhecida tanto pelo município de Santo Amaro quanto pelo Estado da Bahia. Agora esperamos que o reconhecimento seja de todo o Brasil”.

A celebração Bembé do Mercado de Santo Amaro

Existem diversas teorias sobre o uso do nome Bembé, quase todas assentadas nos processos da diáspora africana. Entretanto, a pesquisarealizada pela Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB) e Iphan com os praticantes mais antigos indica que o nome deriva de Candomblé́.

O Bembé é como um balaio de história, cultura, arte e ação política que acolhe o melhor das expressões do Recôncavo Baiano. A capacidade inventiva e transformadora desta festa permitiu que ela sobrevivesse neste espaço por mais de um século, sendo um marco contra o passado escravagista. Por isso, sua relevância para a memória, a história e a cultura nacional.

A presidente do Iphan, Kátia Bogéa, explica que “A celebração compreende uma multiplicidade de sentidos, a ser entendida e vivida de várias maneiras, sendo capaz de se integrar às histórias de vida de seus agentes entre si, na cidade e para fora dela, e por isso considerada uma celebração única. É fonte de sabedoria, de ciência, de memória, de diplomacia, de zelo e, mais do que tudo, é uma possibilidade única – como a festa – de formação de identidade”.

O Bembé se caracteriza como uma obrigação religiosa destinada às divindades das Águas para agradecer e propiciar o bem-estar da coletividade. São três momentos cerimoniais: os ritos ligados ao fundamento da festa (as cerimônias para os ancestrais, o Padê de Exu, o Orô de Iemanja e Oxum); o Xirê do Mercado e a entrega dos Presentes destinados a Iemanjá; e a Oxum. Contudo, sua produção e execução envolvem diversos atores sociais como os comerciantes locais, pescadores, ativistas políticos, brincantes de Maculelê e detentores de bens já registrados como Patrimônio Cultural do Brasil, sambadoras e sambadores de roda do Recôncavo e capoeiristas.

A festa secular tem, também, outros bens culturais associados, como a do Nego Fugido, um teatro que representa a violência da escravidão; o Lindro Amor, cortejo feminino feito para comemoração dos festejos de São Cosme e São Damião; a Burrinha; e a Puxada de Rede, todos relacionados às referências culturais da diáspora africana. Na programação da festa ainda são incluídas atividades realizadas por grupos de dança afro, grupos parafolclóricos e outros da cultura popular.

O Mercado como espaço político-sagrado e de resistência

A cidade de Santo Amaro se constituiu como núcleo açucareiro e fonte de alimentos de subsistência, tendo a escravidão como base dessaeconomia. O comércio realizado no Mercado local, incluindo a venda de peixes, era para os escravizados uma alternativa de obter recursos para a compra da alforria e posterior forma de sustento, sendo o espaço do Mercado também protagonista da história. Mesmo após a Lei Áurea, a população negra, que continuou vivendo as desigualdades econômicas e sociais, enfrentando dificuldades para a livre prática de seus cultos religiosos nos espaços internos e externos aos terreiros.

Para fazer o Candomblé, era necessário obter o aval de autoridades política, além de ocorrer em datas correlacionadas às festividades católicas. Contudo, no dia 13 de maio de 1889, sem qualquer permissão e aos modos de uma celebração religiosa de matriz africana, os filhos e filhas de santos guiados por João de Obá, se uniram na Ponte do Xaréu para celebrar uma data cívica, no centro da vida pública da cidade. E assim teve início essa manifestação cultural e religiosa pública secular. A Rua, o Mar e o Mercado transformam-se em territorialidades expandidas do Candomblé, e durante o Bembé, também lhes conferem uma dimensão política, além de religiosa.

A pesquisa apresentada no Dossiê de Registro elaborado pelo Iphan descreve que, possivelmente, a presença dos capoeiristas e do povo do maculelê era essencial na festa, uma vez que atuavam como uma forma de agentes de segurança diante do Estado ameaçador e repressor.

Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural

O Conselho que avalia os processos de tombamento e registro é formado por especialistas de diversas áreas, como cultura, turismo, antropologia, arquitetura e urbanismo, sociologia, história e arqueologia. Ao todo, são 22 conselheiros, que representam o Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB), a Associação Brasileira de Antropologia (ABA), o Conselho Internacional de Monumentos e Sítios (Icomos), a Sociedade de Arqueologia Brasileira (SAB), o Ministério da Educação, o Ministério do Turismo, o Instituto Brasileiro dos Museus (Ibram), o Ministério do Meio Ambiente, Ministérios das Cidades, e mais 13 representantes da sociedade civil, com especial conhecimento nos campos de atuação do Iphan.

O Conselho Consultivo também vai avaliar durante a 93ª reunião o tombamento do espaço e acervo do Museu ao Ar Livre de Orleans, no município de Orleans, em Santa Catarina.

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