Sic transit gloria mundi | Por Luiz Holanda  

Sic transit gloria mundi é uma frase latina que significa ‘assim transita a glória do mundo’, ou ‘toda glória do mundo é transitória’. Tem sido traduzida, também, como ‘as coisas mundanas são passageiras’.
Sic transit gloria mundi é uma frase latina que significa ‘assim transita a glória do mundo’, ou ‘toda glória do mundo é transitória’. Tem sido traduzida, também, como ‘as coisas mundanas são passageiras’.

Na véspera de assinar uma emeda constitucional permitindo a reabertura do Congresso Nacional e o restabelecimento da plenitude constitucional, o presidente Costa e Silva – aos 66 anos de idade-, começou a sentir tonturas e dores de cabeça, os primeiros sinais de uma trombose cerebral que acabou por impedi-lo de continuar no poder. A data era 26 de agosto de 1969.

A emenda à Constituição fora preparada pelo vice-presidente da República, Pedro Aleixo, com publicação marcada para 30 do mesmo mês. Entretanto, o presidente não conseguiu assiná-la, pois sua mão direita deslizava sobre o papel, sem controle. A solenidade ocorreria no Palácio das Laranjeiras, no Rio de Janeiro, onde  o presidente se encontrava. O lado direito do seu corpo estava completamente paralisado.

O governo de Costa e Silva constituiu uma época de grande instabilidade política. O clima de insatisfação abrangia setores da sociedade cada vez mais amplos, com intelectuais, estudantes e clérigos liderando passeatas, protestando contra o arrocho salarial e clamando por liberdade. A insatisfação era geral, inclusive dentro das forças armadas, reacendendo antigas divergências não superadas. Um artigo do marechal Mário Poppe de Figueiredo, publicado no Jornal do Brasil sob o título “Revolução e desenvolvimento”, levou o presidente a reforçar a disciplina militar para impedir manifestações públicas de militares da reserva.

Com a doença de Costa e Silva, os ministros militares trataram logo de formar uma junta capaz de governar o país até que um novo governo fosse formado, pois tudo indicava que o presidente não retornaria. Para tanto, divulgaram um boletim médico atestando que o presidente sofrera uma crise com manifestação neurológica grave, que exigia repouso absoluto. Em seguida, no dia 31, assumiram o poder em sua totalidade, pois, do contrário, a crise institucional era inevitável.

O almirante Augusto Rademaker Grunewald, o general Lira Tavares e o brigadeiro Márcio de Souza e Mello, respectivamente ministro da Marinha, do Exército e da Aeronáutica militar assumiram o governo “de acordo com os textos constitucionais em vigor” e “enquanto durar o impedimento do chefe da Nação”. O instrumento jurídico que oficializou a mudança foi o Ato Institucional nº 12 (AI-12), comunicando o afastamento de Costa e Silva e a assunção do governo pela Junta. Uma nota lembrava que o AI-5 continuava em vigor.

Lira Tavares era um general que amava a poesia e as letras, mas não tinha muita habilidade para comandar. Dificilmente se arriscava em tomar uma decisão própria. Daí a perda de controle do Alto Comando do Exército. Como os militares não aceitavam que um civil assumisse o governo, o vice, Pedro Aleixo, acabou por fazer parte da Junta que governou o país por 60 dias, até a posse do general Emílio Garrastazu Médice.

Como prêmio pela transição pacífica do poder, Tavares foi nomeado embaixador do Brasil na França, seu último cargo público. Antes disso foi eleito para a Academia Brasileira de Letras, ganhando a disputa contra o poeta Ledo Ivo. A literatura e a poesia eram, ao lado do Exército, sua grande paixão.

Publicou 17 livros, a maioria sobre historiografia militar. Também escreveu poesia, sob o pseudônimo de “Adelita”, uma combinação das primeiras silabas de seu nome e sobrenome. Antes de ser nomeado embaixador na França dizia que havia deixado definitivamente as funções públicas. Tinha 64 anos quando, juntamente com os  demais membros da Junta, passou o governo para o sucessor. De uma forma bastante melancólica confessou: “Quero voltar a ser eu mesmo”. Nunca voltou.

Morreu de parada cardíaca no Rio de janeiro, aos 93 anos, completamente esquecido. A frase contida no trabalho “Imitação de Cristo”, do monge agostiniano Tomás de kemps e utilizada como título deste artigo, nos mostra como tudo na vida é passageiro. Era lembrada para chamar a atenção durante o ritual da coroação papal até 1963, um ano antes de os militares derrubarem o presidente Goulart, tomarem o poder e governarem o país por quase trinta anos. Mesmo assim, a glória passou.

*Luiz Holanda, advogado e professor universitário.

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Sobre Luiz Holanda 482 artigos
Luiz Holanda é advogado e professor universitário, possui especialização em Administração de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas (SP); Comércio Exterior pela Faculdades Metropolitanas Unidas de São Paulo; Direito Comercial pela Universidade Católica de São Paulo; Comunicações Verbais pelo Instituto Melantonio de São Paulo; é professor de Direito Constitucional, Ciências Políticas, Direitos Humanos e Ética na Faculdade de Direito da UCSAL na Bahia; e é Conselheiro do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB/BA. Atuou como advogado dos Banco Safra E Econômico, presidiu a Transur, foi diretor comercial da Limpurb, superintendente da LBA na Bahia, superintendente parlamentar da Assembleia Legislativa da Bahia, e diretor administrativo da Sudic Bahia.