O urso e o elefante: A parceria entre Rússia e Índia como pilar de um novo século asiático

Subrahmanyam Jaishankar e Sergei Lavrov, ministros de Relações Exteriores da Índia e Rússia, respectivamente.
Subrahmanyam Jaishankar e Sergei Lavrov, ministros de Relações Exteriores da Índia e Rússia, respectivamente.

A Rússia tornou-se recentemente a quarta parceira comercial mais importante da Índia, atrás somente de Estados Unidos e China.

De acordo com dados do Ministério do Comércio e Indústria indiano, no primeiro trimestre desse ano Nova Deli aumentou a importação de mercadorias russas em 4,2 vezes, chegando ao patamar de US$ 20,5 bilhões (R$ 97,9 bilhões).

No ano passado, a Rússia já havia se tornado a principal fornecedora de petróleo à Índia, ultrapassando a posição de países como Iraque e Arábia Saudita. Em vista desses números, hoje é possível afirmar que a parceria política e econômica entre russos e indianos será um dos principais pilares para a construção de um novo século asiático.

Além do comércio, vale lembrar que as relações Moscou-Nova Deli são historicamente marcadas pela cooperação técnico-militar desde o período soviético. É por conta disso que a Índia ocupa a tradicional posição de grande importadora de armas e equipamentos da Rússia ao longo das últimas décadas.

No mais, na qualidade de Grandes Potências do asiático, Rússia e Índia têm implementado desde os anos 2000 uma série de políticas que visam reestruturar a ordem global no plano eurasiático, limitando a influência de atores extrarregionais, como Estados Unidos e União Europeia.

Uma dessas políticas foi a criação em 2006 do grupo RIC (composto por Rússia, Índia e China), cujo objetivo se concentrava em coordenar posições comuns a respeito de temas importantes no âmbito regional e internacional.

No mais, essa ideia de defender os interesses nacionais da Rússia por meio de uma cooperação mais profunda com potências asiáticas como a Índia fora preconizada pelo importante diplomata Evgeny Primakov (ministro das Relações Exteriores de 1996 a 1998 e primeiro-ministro russo entre 1998 e 1999).

Para Primakov, o estabelecimento de alianças com países como Índia e China permitia à Rússia facilitar o processo de consolidação de um mundo multipolar que refletisse adequadamente a pluralidade civilizacional e de sistemas de valores nas relações internacionais.

Em tempos recentes, por sua vez, diante de um complicado contexto de sanções por parte do Ocidente ao país, a Rússia enxerga na Índia um país fundamental para a sua “viragem asiática”, situação essa reconhecida pelo mais recente Conceito de Política Externa assinado por Vladimir Putin ainda nesse ano.

A Índia, além do mais, não se alinhou ao Ocidente nas votações condenatórias à Rússia durante as sessões da Assembleia Geral nos últimos dois anos (seguindo o exemplo de China e África do Sul, dois dos membros do BRICS), demonstrando uma maior neutralidade em relação ao conflito, apesar da pressão ocidental.

Não obstante, com as tentativas da União Europeia e dos Estados Unidos de utilizar os ativos sequestrados da Rússia em suas instituições para a reconstrução futura da Ucrânia, russos e indianos começaram a enxergar a necessidade de migrar gradualmente o seu comércio para moedas alternativas.

A contestação do papel do dólar como moeda de transação global, assim como da suposta “neutralidade” das organizações comandadas pelo G7, levou a Rússia e diversos outros países a repensar suas relações de dependência para com estas instituições.

A Índia, nesse ínterim, passou a realizar boa parte de suas compras de petróleo da Rússia em rupias. Com efeito, as empresas do setor energético russo (como a Gazprom e a Rosneft) há tempos adquiriram a capacidade de negociar commodities em outras moedas, que não o dólar.

Essa experiência tem sido exercitada nas relações da Rússia com a China, por exemplo, na qual as companhias russas utilizam os yuans obtidos por suas exportações para pagar por produtos e serviços chineses. Um cenário similar tem sido aos poucos implementado no comércio entre Rússia e Índia, por sua vez.

Em caráter complementar, é importante notar que tanto Rússia como Índia identificam-se como “países continentais”, cujo tamanho, população, localização e potencial econômico, os credenciam de forma natural a um papel de grande destaque no jogo de forças internacional.

Ambos os países também se apresentam como verdadeiros Estados-civilizações, cuja cooperação não somente bilateral, mas também no âmbito do BRICS, tem funcionado como um anteparo ao projeto cultural hegemônico do Ocidente.

Moscou e Nova Deli, portanto, comprometeram-se a defender uma ordem mundial mais justa e multifacetada, na qual os Estados possam exercer o direito de escolher o seu próprio destino, sem qualquer tipo de interferência externa.

*Com informações da Sputnik.

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