Comemoração dos 32 anos da Escola Mestre Irineu Serra, em Rio Branco, Acre | Por Juarez Duarte Bomfim

Escola Mestre Irineu Serra
Escola Mestre Irineu Serra

Manhã de sábado, 1º de outubro de 2022, foi dia de festa na Vila Irineu Serra, em Rio Branco – Acre. Comemorou-se os 32 anos de fundação da Escola Mestre Irineu Serra, do sistema de ensino público municipal, oferecendo vagas para crianças da 1ª a 5ª serie do Ensino Fundamental.

A origem do atual educandário é uma escola comunitária, denominada ‘Escola Cruzeiro’, idealizada e criada pelo líder religioso e comunitário Mestre Raimundo Irineu Serra, nas terras sagradas do Alto Santo, na década de 1950.

O começo da história é o ano de 1945, quando Raimundo Irineu Serra se transferiu da Vila Ivonete para as terras do Alto Santo — atual Vila Irineu Serra. Alto Santo era a abreviação do nome “Alto da Santa Cruz” que o Mestre Irineu tinha dado para rebatizar a antiga Colocação Espalhado do grande Seringal Empresa.

Sua irmandade trabalhadora logo o segue para a labuta no campo, acompanhando o Padrinho Irineu. Se estabelece uma progressista comunidade agrícola no meio da floresta, com o sistema de produção em mutirões e adjutórios, e esta coletividade será responsável por abastecer a feira-livre de Rio branco com hortaliças e verduras, reduzindo assim o preconceito que os habitantes da Capital tinham daquele grupo social rurícola, afro-descendente e pobre, que fazia uso da beberagem hoasca.

Logo, o Velho Mestre sentiu a necessidade de fundar uma escola para educar as crianças. E assim surge a Escola Cruzeiro, que educou gerações dê rio-branquenses e acreanos que viviam naquela distante comunidade rural.

Na condição de professores lá trabalharam Luiz Mendes do Nascimento, Percília Matos, Lourdes Carioca, João Facundes (Nica), Luiza Cruz (neta do Mestre Irineu) e, mais recentemente, a pedagoga e professora Lílian Amim.

Atualmente, a massoterapeuta Aline Lima, moradora da Comunidade, é integrante do quadro técnico-administrativo da referida escola.

Pelos bancos escolares deste educandário passaram o saudoso Tufi Rachid Amim, sargento do Corpo de Bombeiros e produtor rural, Francisco Costa do Nascimento (Dr. Chiquinho), renomado jurisconsulto acreano, o violonista Cleyton Souza e muitos outros que se tornaram profissionais de sucesso.

Juarez Bomfim, Cecilia Maringoni e Aline Lima
Juarez Bomfim, Cecilia Maringoni e Aline Lima

É festa

Eu, Juarez Bomfim e a amada consorte, Cecilia Maringoni, fomos convidados para os festejos comemorativos dos 32 anos de fundação da Escola Mestre Irineu Serra, e para lá nos dirigimos, na agradável manhã de sábado. As alegres vozes infantis geram uma atmosfera de alegria na área de lazer daquela unidade escolar.

As crianças se dividiam em dois entretidos grupos: o grupo da ‘roda de capoeira’ que aprendia e exercitava este esporte genuinamente nacional; e o grupo de crianças que se entretinha em atividades lúdicas, com brinquedos e jogos construídos a partir de material reciclável. Assim transcorria a manhã.

Brinquedos e jogos com recicláveis
Brinquedos e jogos com recicláveis

Parabéns pra você

Hora do lanche. Mas antes, foram cantados os “parabéns” pelo transcurso dos 32 anos de fundação da Escola Mestre Irineu Serra. Ele, lá do mundo astral, certamente sorria, feliz.

Foi servido um saboroso “cachorro quente” para as crianças e os convidados, acompanhado de refrigerantes, e o delicioso bolo de aniversário. Por todo o evento, as crianças eram bem assistidas por atenciosos professores, que mantinham zelosamente a disciplina da garotada.

Reciclagem
Reciclagem

Apresentação musical

O ponto alto da festa veio a seguir: a apresentação musical das cantoras e instrumentistas da escola de música Baquemirim, escola comunitária de formação artística dos jovens da Comunidade da Vila Irineu Serra (Rio Branco – Acre).

À frente do Projeto musical ‘Baquemirim’ está o musicista e produtor cultural Alexandre Anselmo, figura chave para a realização do trabalho de memória musical da Comunidade.

Durante a apresentação, entre um número musical e outro, Chayane Carioca – coordenadora do grupo, narrava causos relacionados a cada composição. E anunciou a elaboração do ‘Escola Cruzeiro – Álbum musical – Volume 2’, já em fase de construção coletiva.

Banda Baquemirim
Banda Baquemirim

Escola Cruzeiro – Álbum musical – Volume 1. Texto de Chayane Carioca para o álbum:

“Atualmente nas escolas publicas e universidades do estado do Acre e em qualquer pesquisa acadêmica em todo o mundo, quando se questiona sobre uma música autenticamente regional acreana o Santo Daime é citado como um principal exemplo. Na década de 1930 Raimundo Irineu Serra iniciou sua obra cultural espiritual utilizando a ayahuasca, um chá enteógeno utilizado milenarmente pelos povos originários da Amazônia ocidental, na área periférica de Rio Branco.

“Neste local atualmente conhecido como bairro Manoel Julião sua comunidade foi duramente perseguida e em 1945 conseguiu migrar para um seringal, área de mata nativa horas distante da cidade onde conseguiram desenvolver seu modo de vida em liberdade. Mestre Irineu, sempre acompanhado destas famílias, durante décadas recebeu doentes desenganados que por seu trabalho eram curados e muitos se fixaram na comunidade.

“A prática de criar versos e a criação de melodias era constante no dia a dia, como recreação e exercício intelectual através de adivinhas, enigmas e histórias contadas à luz da lamparina antes de dormir. No uso da ayahuasca a música produziu alguns milhares de canções espirituais através de muitas gerações que viveram por décadas por pela experiência. Estas músicas são chamadas de hinários e dão de uso restrito aos trabalhos espirituais, não sendo permitias para publicações e veiculações com outros fins.

“Além da música sagrada dos rituais, também existiu a composição artística, que ainda é denominada simplesmente de “música”, fazendo uma distinção entre sua finalidade restrita de uso espiritual e a de uso social em festas, homenagens, recreação, educação, aconselhamento e até de forma pioneira, denunciando temas como o racismo por exemplo.

“Segundo seus contemporâneos, Mestre Irineu Serra compunha no dia a dia, durante os trabalhos de roçados, e também presenteava seus afilhados com canções. A comunidade também retribuía compondo músicas em sua homenagem e no geral, desde a infância até o falecimento, seja recebendo hinários ou compondo músicas, a criação acontecia muito naturalmente no dia a dia, cumprindo também uma dinâmica de comunicação social.

“No final da década de 1950 foi criada uma escola para alfabetização de crianças e adultos que funcionava dentro da sede dos trabalhos de Daime, batizada de Escola Cruzeiro. Foram criadas ou recolhidas e depois ensinadas para as crianças, músicas coreografadas e canções em língua indígena e então apresentadas para o mestre e comunidade no dia dos mestres e outras datas importantes.

“Deste universo musical, até o anos de 2018 só restavam os hinários de uso restrito ao contexto espiritual, até que a senhora Raimunda Serra começou a rememorar e ensinar as canções de uso social que estavam esquecidas. Com o incentivo da liderança espiritual e da esposa do Mestre Irineu, a senhora Peregrina Gomes Serra, diversos contemporâneos participaram de um projeto para a recuperação e registro fonográfico deste universo musical.

“É um álbum musical comunitário, com a participação de 5 gerações que procurou reconstituir a linguagem da época através de trabalho de pesquisa junto aos mestres tradicionais, priorizando a execução dos instrumentos e vozes por estas famílias. Muitos deles aprenderam este repertório ainda crianças e é uma sorte muito grande a participação deles neste registro. São eles: Raimunda Serra, Jane Carioca, José Carlos Carioca, Júlio Carioca, Leonel Grangeiro, Guilherme Grangeiro, Francisco de Assis (Sr. Preto), Chayane Carioca, Cris Grangeiro, Luis Lima e Leilane Grangeiro.

“Gravado no ano de 2021, em Rio Branco na comunidade Alto Santo, com recursos da Lei emergencial Aldir Blanc de socorro à cultura na pandemia.

“Está disponível em todas as plataformas musicais! Aproveitem!

“Alexandre Anselmo, gratidão! Sem Você esse projeto jamais sairia do papel!”

(Texto de Chayane Carioca).

Escola Cruzeiro – Álbum musical. Link para o Spotify:

Banner da Prefeitura de Santo Estêvão: Campanha do São João 2024.
Banner da Campanha ‘Bahia Contra a Dengue’ com o tema ‘Dengue mata, proteja sua família’.
Sobre Juarez Duarte Bomfim 726 artigos
Baiano de Salvador, Juarez Duarte Bomfim é sociólogo e mestre em Administração pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), doutor em Geografia Humana pela Universidade de Salamanca, Espanha; e professor da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS). Tem trabalhos publicados no campo da Sociologia, Ciência Política, Teoria das Organizações e Geografia Humana. Diversas outras publicações também sobre religiosidade e espiritualidade. Suas aventuras poético-literárias são divulgadas no Blog abrigado no Jornal Grande Bahia. E-mail para contato: juarezbomfim@uol.com.br.